sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Na Mídia, o Desfile de um Mundo Inatingível


Entrevista publicada de forma impressa e também on line no site do MEC com o professor Yves de La Taille, que trata de forma bem realista a influência dos programas televisivos sobre as crianças e propõe à escola e à família uma postura de proteção para a criança.

Boa leitura!!






por Fabíola Pereira do Lago



Para o professor Yves de La Taille, livre-docente do Instituto de Psicologia da USP, responsável pela cadeira de Psicologia do Desenvolvimento, a escola infantil deve ser uma alternativa aos valores massificados pela mídia e pode até mesmo influenciar a família quando faz campanhas consistentes.







Que tipo de influência a programação televisiva pode trazer às crianças de zero a seis anos?



Depende de muitas variáveis, como o nível econômico, a postura da família, da escola. Se a criança tiver acesso à TV por assinatura, por exemplo, terá mais escolhas de programação infantil, senão, como a grande maioria da população, assistirá a programas adultos, pois há poucos programas infantis na TV aberta. Destaque deve ser feito para a TV Cultura, que tem excelentes programas para crianças, realmente pensados do ponto de vista educacional. Logo, não se pode falar de um só tipo de influência.



Essa programação infantil é adequada?



Tem de tudo, do melhor ao pior. O Castelo Rá-tim-bum, por exemplo, é primoroso. Além do bom gosto evidente, diverte, permite à criança viajar em mundos imaginários, apresenta conteúdos relevantes de forma prazerosa, enriquece o universo infantil. Já os programas de auditório, além de passarem um erotismo adulto para a criança (as meninas transformadas em adolescentes em miniatura), freqüentemente são puro merchandising. A criança é eleita como consumidora potencial, o que de fato é, mas sem a capacidade de avaliar a qualidade do produto e seu preço.



A maioria da população brasileira é negra e pobre, mas a imagem veiculada na mídia é oposta. Quais as conseqüências dessa distorção na formação de uma criança?



Em primeiro lugar, na sociedade atual ser consumidor virou sinônimo de ser cidadão. Até a avaliação da economia resume-se ao crescimento do consumo e não enfatiza a qualidade de vida do trabalhador, que era o parâmetro de cidadania até recentemente. Ou seja, quem não tem poder de compra fica excluído, pode sentir-se cidadão de segunda ordem. Também pode surgir um sentimento terrível e destruidor de humilhação. Em segundo lugar, as propagandas, sobretudo as da TV, não falam tanto da qualidade dos produtos veiculados, mas das supostas qualidades pessoais de quem os compra, como inteligência, prestígio social, associação à beleza, coragem, e assim por diante.



É uma forma de marginalização...



Não só desta festa restrita do consumo, como também de ser marginalizado eco¬nomicamente ao comparar-se negativamente a modelos fictícios de excelência. É como se desfilasse diariamente na frente das pessoas pobres um mundo admirável e inatingível. Com isso, a criança poderá sentir-se humilhada e frustrada. As propagandas são um retrato da ideologia atual, que procura substituir a indignação de ser injustiçado pela vã esperança de ser rico e famoso. Professores de educação infantil deveriam falar deste tema com seus alunos, pois as crianças pequenas já estão atentas aos modelos sociais de prestígio.



Muitas crianças assistem à programação adulta, tais como novelas, filmes e noticiários. Essa relação com conteúdos violentos e excessivamente eróticos não é muito precoce?



Desde o século 17, a pedagogia tanto familiar quanto educacional voltou-se para preservar a criança do mundo adulto. Antes da TV, essa realidade chegava por meio de jornais, revistas e pelo rádio. Logo, as crianças nem tomavam conhecimento dela. Hoje, esse contato acontece porque, para muitos pais, assistir a um noticiário, a uma novela, a um filme é seu principal momento de lazer.



Isso é prejudicial?



Não há consenso entre teóricos se isso é bom ou ruim. Pessoalmente, acho que guerras, assassinatos, violência em geral são informações e cenas impactantes que uma criança pequena ainda não tem maturidade intelectual e afetiva para compreender. Sei de muitas crianças que passaram a ter grande medo de aviões, prédios e elevadores depois de assistirem às imagens dos atentados do dia 11 de setembro de 2001 (veiculadas repetida-mente, pergunto-me o porquê). Muitos adultos deixaram seus filhos pequenos vê-las (também me pergunto o porquê). das pessoas pobres um mundo admirável e inatingível. Com isso, a criança poderá sentir-se humilhada e frustrada. As propagandas são um retrato da ideologia atual, que procura substituir a indignação de ser injustiçado pela vã esperança de ser rico e famoso. Professores de educação infantil deveriam falar deste tema com seus alunos, pois as crianças pequenas já estão atentas aos modelos sociais de prestígio.



Muitas crianças assistem à programação adulta, tais como novelas, filmes e noticiários. Essa relação com conteúdos violentos e excessivamente eróticos não é muito precoce?



Desde o século 17, a pedagogia tanto familiar quanto educacional voltou-se para preservar a criança do mundo adulto. Antes da TV, essa realidade chegava por meio de jornais, revistas e pelo rádio. Logo, as crianças nem tomavam conhecimento dela. Hoje, esse contato acontece porque, para muitos pais, assistir a um noticiário, a uma novela, a um filme é seu principal momento de lazer.



Isso é prejudicial?



Não há consenso entre teóricos se isso é bom ou ruim. Pessoalmente, acho que guerras, assassinatos, violência em geral são informações e cenas impactantes que uma criança pequena ainda não tem maturidade intelectual e afetiva para compreender. Sei de muitas crianças que passaram a ter grande medo de aviões, prédios e elevadores depois de assistirem às imagens dos atentados do dia 11 de setembro de 2001 (veiculadas repetida-mente, pergunto-me o porquê). Muitos adultos deixaram seus filhos pequenos vê-las (também me pergunto o porquê).



Como não conseguem compreender um evento como esse, fica apenas o lado trágico, terrível, emotivo, difícil de ser assimilado até por adultos.



Como os educadores podem criar um contraponto a esse cenário?



O mais freqüente é a educação infantil atender crianças encharcadas de mídia. O que os educadores devem fazer é trazer um mundo alternativo; não referendar o que já está massificado. Colocar outras obras musicais, outros textos, outros programas infantis. Os professores podem ter acesso a gravações de muitos programas pelo MEC. Deve-se abrir o leque de opções de valores para que a criança forme seus próprios. Se a escola não fizer isso, quem vai fazer?



O educador vai ter um papel crítico importante nesse sentido, de mostrar opções?



Qualquer pessoa que trabalhe com educação, seja em que nível for, por estar ajudando a formar um cidadão, tem como dever ser crítica em relação à sociedade na qual vive.



Esses valores alternativos podem influenciar a família?



Tenho certeza de que sim! Posso dar um exemplo, a campanha antitabagista faz crianças criticarem e policiarem seus pais fumantes. Se a escola empenhasse 1% dos esforços que costuma empreender com esta campanha para a paz e a solidariedade, por exemplo, teria uma certa influência. E isso desde a educação infantil, pois a construção de valores começa já aí. Mas ela não costuma fazê-lo.



É uma pena...





“A pessoa que trabalha com educação tem como dever ser crítica em relação à sociedade na qual vive.”



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